sábado, 1 de agosto de 2015

Crónicas do Alto da Vila (por Inês Valadas)_01.08.2015

Exaltação Alentejana

Elevam-se hoje os campos àqueles que com os olhos postos neles os amam já pela admiração. Elevam-se, os pequenos campos, e podiam dizer-se outrora morada do Deus que tudo de belo cria, tão altos, beijando suavemente o azulado suave de um céu aberto que não sabe mais que dar boas-vindas.

Abertos encontram-se também os braços beijados pelo mesmo dourado que pinta planícies, como se de ouro, pelo dourado que queima docemente qualquer um que ouse calcorrear calçadas e veredas estreitas, velhas mas sábias, com histórias para contar que nem eu mesma conheço.

Tudo o que aqui se faz, faz-se com amor e orgulho embrulhado em peitos que alentavam as mãos feridas que ergueram colinas e casas – casas e lares, que não são apenas de quem os construiu mas de todos aqueles que, hoje, melhor os  decoram. Com palavras gentis e sorrisos, olhares perdidos para lá do espelho de água, perscrutando a beleza da serenidade da natureza alentejana que perante si se ergue, senhora mãe e senhora filha – em cada momento fazendo-se fénix.

Eleve-se hoje o refúgio da parafernália quotidiana, da contemporaneidade amestrada e manipulada e nele se fechem os olhos para que o vento corra, criança, de mansinho pela pele. Nele se fechem os olhos, principalmente, para escutar o silêncio das vozes, roucas e vibrantes de quem canta da Humanidade o pequeno oásis que é Monsaraz. – Quando a ele se chega nunca mais dele se parte.

Mas que seria a glorificação de pai, sem seus filhos? Que seria falar de Monsaraz sem falar de todas as pequenas aldeias que grande discurso nos deixam na memória – em histórias pinceladas, cristalizadas na simplicidade do barro que é o pó que os nosso pés pisam e que nasce da magia ancestral de quem sabe amar a sua tradição; em rochas que encerram em si o poder da crença ainda menina resultando dela um sorriso aberto quando a pedrinha se equilibra na Rocha dos Namorados; na cidade de onde provém o elixir que próprio Baco teria cobiçado. Que seria, ainda, não falar deste cantinho que hoje se estende por fotografias e melodias e esplanadas e varandas que nos deixam sempre a mesma sensação: é tão grande o mundo, mas tão maior o Alentejo. Mas tão maior a distância entre o Alqueva e o céu. Mas tão melhor a proximidade da vida á terra, onde a vida e a terra se misturam numa só. Como sempre o foram.

Cante-se, em uníssono, as belezas destas muralhas ao sol, o seu reflexo naqueles que as carregam às costas como suas, por suas. Cante-se a vida. Serena, apaziguadora. Cante-se o canto de anos e anos de madrugadas frescas e tardes solarengas, molengonas, como por cá dizemos, porque por cá dizemos. Cante-se isso tudo com o canto das aves, e o sussurro das águas, e as gargalhadas com o forte sotaque característicos e cante-se a nossa terra. Cante-se a nossa origem. Cante-se o nosso orgulho, porque ele pode e ele deve e ele vai.

Sem importar gerações, géneros, crenças. Cante-se o simples esplendor da natureza em comunhão com a humanidade onde a natureza e a humanidade se seguram e se apoiam mutuamente.

Elevo hoje o cantinho á beira Alqueva plantado, cantinho lato no meu coração. Cantinho lato na minha canção. Cantinho, que será, sempre lato na minha condição.


Quando a nós ele  chega, nunca mais de nós ele parte. 

Crónicas do Alto da Vila, por Inês Valadas 
01.08.2015
(Fotografia de António Caeiro)



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